Adeus
Cardosofilho
Francisco
Alves lançou, em 1947, a canção “Adeus, Cinco Letras Que Choram”, de Silvino
Neto, cuja versos iniciais diziam: “adeus, adeus, adeus/ cinco letras que
choram/ num soluço de dor...”. Seguia por aí, num lamento
de despedida.
Esse samba-canção era ouvido pelo rádio por ocasião do enterro de Chico
Alves, morto em 27.09.1952, em acidente de automóvel. O esquife desfilava pelas
ruas do Rio de Janeiro cercado pela multidão que se despedia de seu cantor
maior, e as emissoras de rádio transmitiam o cortejo tendo ao fundo a canção de
adeus. Ocorreu-me a lembrança no momento do impeachment da ex-presidente Dilma
Rousseff, finalmente aprovado em 31.08.2016 (agosto, sempre agosto!). Claro que
o conteúdo da canção não se aplica com inteireza ao caso, mas os quatro versos
iniciais cairiam bem nos lábios da madame Rousseff, a combinar com o momento,
para ela, de profunda dor, desgosto e amargo arrependimento. Tudo tardio.
Triste e preocupante é que esses sentimentos se misturam com rancor, demagogia
e incitamento à guerra. O velho e conhecido ódio e populismo petistas.
Finalizado o doloroso
momento, inexiste motivo para alegria geral. Há alívio, eis o caso, pelo
afastamento definitivo de quem tanto mal fez ao País. Pôs-se fim a uma etapa
difícil e custosa, cuja conta estamos pagando em desemprego, inflação elevada e
maior crise econômica já enfrentada pelo Brasil. Conta cujo peso maior recai,
como sempre, sobre os brasileiros que menos podem, pelos mais pobres. E me vem
à mente a figura grotesca de Chico Buarque, sentado entre Jacques Wagner e Lula
na galeria do plenário do Senado Federal, assistindo a uma das etapas da sessão
que determinou o fim do mandato da presidente. Um boa-vida, mergulhado no
melhor que o capitalismo pode proporcionar, fazendo pose característica de
intelectual de esquerda engajado na suposta e falsa luta dos comunistas pelos
mais pobres. A antiga farsa inaugura em 1917, pela Revolução Russa, que tanto
sangue e maldade espalhou pelo mundo. Para Chico Buarque, e outros artistas
bem-sucedidos e iguais a ele no alinhamento ideológico, não existe a horrorosa
crise econômica e social produzida pelos desmandos dos nefastos e corruptos
governos petistas.
Escrevia eu que não há razão
para alegria. Cabe, sim, refletir sobre a origem e razões do terrível equívoco
cometido por boa parte da população brasileira, que ingenuamente embarcou na
canoa petista, na qual, por sinal, jamais pus o pé. Em nenhum momento, nesses
anos todos, me iludi com as promessas de moralidade e ética do Partido dos
Trabalhadores (PT) e jamais considerei Lula – mesmo o Lulinha “paz e amor”, muito
menos Dilma Rousseff, a gerentona – à altura de presidir o Brasil. Ainda que a
tese possa ser discutível, alio-me aos que consideram que um país precisa ser
governado por seus melhores homens. Por sua elite intelectual e moral. Pelos
mais preparados. Pelo escol de suas inteligências. Por esse caminho, é mais
fácil acertar. Evidente que moralidade não é privativa dessa elite e o cuidado
quanto a isso é indispensável, mas um despreparado, mesmo que idôneo, para a
magnitude e complexidade do cargo de governar um estado, um país, é risco
demasiado. Sério convite para o desastre.
Michel Temer, a quem não entregaria meu voto em condições normais, tornou-se
a saída possível. Resta-nos seguir com ele, cuidando de seus atos e com a
esperança de que suas promessas de reformas serão cumpridas. O Brasil inicia
uma nova fase, na qual o poder político será exercido sob o olhar atento dos
cidadãos, hoje muito mais ativos em cobranças do que no passado, graças à
comunicação pelas redes sociais via internet. Os políticos sabem que os tempos são
outros.
O tempo para Michel Temer será curto para as graves reformas que o Brasil
requer, mas precisa cumprir sua parte no esforço de mudar e recuperar o Brasil.
Vamos ver. Aguardemos sem excesso de otimismo e com disposição de não aceitar com
leniência e passividade um governo meia-boca. O rugir das ruas mostrou o quanto
vale.
Agosto de 2016.
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