quinta-feira, 6 de abril de 2017

Político? Hummm...

Político? Hummm...
Cardosofilho

Ouvir discurso de político brasileiro é, modo geral, o mesmo que ouvir piada antiga, conhecida, sem-graça e mal contada. Foi o que sucedeu dias atrás com prezada amiga e leitora, ao assistir a uma sessão da Assembleia Legislativa do Paraná. Cansou-se da discurseira vazia, perdeu a paciência e bateu em retirada.
Fez bem. Político hoje em dia, sem credibilidade, sem discurso que valha a pena ouvir, rebaixado moralmente – ressalvadas as exceções que mais confirmam a regra do que atenuam o quadro deprimente –, está difícil de suportar. Não foi sempre assim. Vereadores, deputados e senadores já foram dignos de mais respeito. Havia, arrisco dizer, mais honestidade nesse meio. Roubava-se menos, havia um certo pudor, um certo limite não escrito para as falcatruas. Vejam, amigos, o caso de Getúlio Vargas: esteve na presidência do Brasil de 1930 a 1945 (de 1937 a 1945, como ditador, no chamado Estado Novo); depois, de 1951 a 1954, e em seu legado não consta haver enriquecido com dinheiro público. Cometeu outros pecados, é verdade, mas nenhum que o tornasse merecedor da pecha de ladrão. Suicidou-se em agosto de 1954, em meio à crise política deflagrada pelo atentado à vida de seu mais feroz opositor e crítico, o jornalista e político Carlos Lacerda, crime tramado nos subterrâneos do Palácio do Catete sem seu conhecimento, do qual resultou a morte do major Rubens Vaz, da Aeronáutica.
Pois meu pai Joaquim Cardoso da Silveira atuou na política em boa parte da vida (de 1925 a 1955). Além de prefeito de Santo Antônio da Platina por doze anos, foi deputado estadual de 1948 a 1955. Neste período, eu, na ingenuidade da infância, não conferi maior importância a seu status. Faltava-me a consciência de que era relevante e respeitado. Notava apenas que, em certas circunstâncias, como na escola, me tratavam com alguma deferência, e numa dessas fui designado para plantar a muda de árvore no Dia da Árvore, em 21 de setembro (hoje, e desde1965, a data é chamada de Festa Anual da Árvore). Tirou-se até uma fotografia do momento em que eu depositava a muda na pequena cova aberta no pátio do Centro Educacional Guaíra, hoje Colégio Estadual Guaíra, em Curitiba. A foto, infelizmente, desapareceu, como tantas outras coisas de minha infância. Bem mais tarde é que percebi que poderia ter desfrutado aqueles dias com o sentimento honroso de ser filho de um deputado estadual, ainda mais que carregava o seu nome, apenas com acréscimo de Filho, para diferenciar. Fosse hoje, no entanto, eu talvez tentasse ocultar o fato. Sim, porque ser filho ou parente de político pode, em vez de gerar prestígio, ser constrangedor, de tal modo foi conspurcada a carreira. Arrisca provocar olhares de esguelha e, hummm, desconfiança.
Joaquim Cardoso exerceu os mandatos públicos com integridade, e sua reputação moral constituiu o legado do qual os filhos desfrutaram com o peito estufado. Na verdade, a política o empobreceu. Quando, em janeiro de 1956, retornamos a Santo Antônio da Platina, precisou vender a casa que construíra em Curitiba, para recomeçar a vida como pequeno agricultor de café, atividade que durou até próximo da morte, ocorrida em outubro de 1977.
A honestidade tem preço. Nenhum de seus filhos recebeu, daquele período de poder político, qualquer vantagem, uma função pública bem-remunerada, um cartório, por exemplo. Nada. Saíram todos com as mãos abanando. Depois, no primeiro governo de Ney Braga, em 1961, meu irmão Benedito Cardoso da Silveira foi convocado pelo novo governador a vir para Curitiba para comandar a Casa Civil da administração que se formava. Experimentado na política, meu pai o desaconselhou, mas Benedito Cardoso, advogado de renome na região do Norte Pioneiro, conhecido como Dudu Cardoso, sentiu-se obrigado a contribuir para a administração de Ney Braga. Deixou de lado a banca de advocacia e mudou-se para a Capital. Perdeu tempo e bastante dinheiro. Também ele não possuía o perfil para conviver com as malandragens da política.
Nessa altura, nasceu em nossa família a decisão de não mais se enfiar em política. Tacitamente, sem nenhuma reunião, sem nenhum comando. As experiências falavam por si. Muito depois, alguém me perguntou por que ninguém havia seguido os passos do patriarca, na política. Então lhe contei esta história.

Abril de 2017.

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