sexta-feira, 22 de novembro de 2019

Maria Julia Carreira Pacheco, nossa querida confreira, toma posse como membro correspondente na Academia de Letras José de Alencar no próximo dia 27/11. Vivendo atualmente em Leiria, Portugal, eis que ela nos brinda com um lindo relato sobre "Saudades e Escolhas". Não deixem de ler!


SAUDADES E ESCOLHAS

O que estas duas palavras têm em comum?
Por que falar em saudade? Saudades que sinto de todos que deixei no Brasil. E, por que falar em escolhas? Por que estamos sempre fazendo escolhas e algumas delas acabam em saudade.
Escrever sobre estas palavras também foi uma escolha e compartilhar com pessoas ilustres como vocês  é uma grande responsabilidade. Mas, vamos lá!
A saudade sempre esteve presente em minha vida. Sou filha de imigrantes portugueses que frequentemente manifestavam as saudades daqueles que ficaram em Portugal, quando escolheram vir para o Brasil em busca de melhores oportunidades. Desta união nascemos eu e meu irmão. Sempre percebemos que nossa família era um pouco diferente. Não convivíamos com nossos avós, tios, primos como a maioria das pessoas. A festa de Natal era quase sempre muito pequena, somente nós os quatro. Sabíamos que em algum lugar tínhamos uma grande família porque nossos pais, cheios de saudades,  sempre falavam sobre eles e também pelas cartas que chegavam.
Sim, as  notícias da família, por carta ou telegrama! O carteiro era sempre muito esperado! Ainda hoje lembro o sentimento de alegria quando uma carta chegava, mas também das lágrimas de meus pais quando um telegrama trazia uma notícia ruim. Entretanto, cartas e telegramas pressupunham leitura e escrita e aí havia um problema. Meu pai tinha pouca escolaridade e minha mãe era analfabeta. As cartas eram lidas e respondidas pelos vizinhos. A  esperança  de que isso mudasse estava em minha escolarização.  E assim aconteceu! Aos seis anos fui para a escola com o principal objetivo de aprender a ler e escrever. Com pouco mais de 6 meses de escola já lia e escrevia as cartas para Portugal. Como podem notar aprendi muito cedo qual era a função social da leitura e da escrita. Ler e escrever as cartas permitiu, apesar da distância geográfica, estabelecer um laço muito forte com a família que estava do outro lado do Atlântico. Era como se eu conhecesse cada um deles pessoalmente.  E, mesmo sem conhecê-los, sentia saudades.
Hoje, por escolha, estou aqui, em Portugal! Muitos daqueles com quem me correspondia já não estão mais entre nós. Agora estou distante de amigos e de um pedaço da família que deixei no Brasil. As cartas já não são mais o principal meio de comunicação, há o Wattsapp, o Skype, o Messenger, o Facebook, o Instagran, o e-mail e tantos outros recursos, nas palmas de nossas mãos 24 horas por dia e que tornaram o planeta um lugar muito pequeno, mas, a saudade... Ah, a saudade! Sim, ela continua existindo!
 “A SAUDADE É UMA TATUAGEM NA ALMA: SÓ NOS LIVRAMOS DELA PERDENDO UM PEDAÇO DE NÓS.” (Mia Couto. O outro pé da sereia. Lisboa/ Portugal. Ed. Caminho, 2006.)
Um abraço cheio de saudades para cada um de vocês!

Maria Julia Carreira Pacheco
17 outubro de 2019.

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