sexta-feira, 10 de janeiro de 2020

OBESIDADE INFANTIL, PUBLICIDADE DE PERFIL?

OBESIDADE INFANTIL,
PUBLICIDADE DE PERFIL?

 
Na quadra festiva que ora finda, ao menos uma das marcas de chocolate dirigiu, no pequeno ecrã, sobretudo às crianças, mensagens com base nos produtos que são o alfa e o ómega do seu negócio, anteriormente baseado nos ovos de chocolate com miniaturais figuras no seu bojo.
Ponto é saber se o fez em conformidade com a lei.
Ao que parece, ninguém se preocupa com aspectos, aparentemente irrelevantes, mas que revestem suma importância.

Curiosamente, nem a base de legislação do Ministério Público/Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa, havida como das mais fidedignas, encerra a actualização do Código da Publicidade veiculada pela Lei 30/2019, de 23 de Abril, já que a última que dela consta é de 2015…!
Estranho País, este!
O que permite se evoque algo que Jorge Sampaio, enquanto presidente da República, pôs na boca de um dos do seu círculo: “em Portugal, a lei não impera, não obriga, não manda; em Portugal, a lei é mera sugestão!”
Só para recordar a quantos se mostrem distraídos: sob a epígrafe “restrições a publicidade a produtos que contenham elevado valor energético, teor de sal, açúcar, ácidos gordos saturados e ácidos gordos transformados”, o n.º 1 do aditado artigo 20-A do Código da Publicidade prescreve:
“A publicidade de géneros alimentícios e bebidas que contenham elevado valor energético, teor de sal, açúcar, ácidos gordos saturados e ácidos gordos transformados é sujeita [a] restrições...”
E, na sequência, proíbe a publicidade a géneros alimentícios e bebidas de elevado valor energético, teor de sal, açúcar, ácidos gordos saturados e ácidos gordos transformados:
  • Em estabelecimentos de ensino pré-escolar, básico e secundário;
  • Em parques infantis públicos e abertos ao público;
  • Num raio circundante de 100 metros dos acessos dos locais referidos nas alíneas anteriores, com excepção dos elementos publicitários afixados em estabelecimentos comerciais, nomeadamente através da colocação de marcas em mobiliário de esplanadas, em toldos ou em letreiros integrados no estabelecimento;
  • Em actividades desportivas, culturais e recreativas organizadas pelos estabelecimentos de ensino, do pré-escolar ao secundário;
  • Em serviços de programas televisivos e serviços de comunicação audiovisual a pedido e na rádio nos 30 minutos anteriores e posteriores a programas infantis, e a programas televisivos que tenham um mínimo de 25 % de audiência inferior a 16 anos, bem como na inserção de publicidade nas respectivas interrupções;
  • Em publicidade realizada nas salas de cinema, nos filmes com classificação etária para menores de 16 anos;
  • Em publicações destinadas a menores de 16 anos;
  • Na internet, através de sítios páginas ou redes sociais, bem como em aplicações móveis destinadas a dispositivos que utilizem a internet, quando os seus conteúdos tenham como destinatários os menores de 16 anos.
A publicidade neste particular deve ser clara e objectiva e não relacionar o consumo do produto a potenciais benefícios para a saúde, abstendo-se, designadamente, de:
  • Encorajar consumos excessivos;
  • Menosprezar os não-consumidores;
  • Criar um sentido de urgência ou necessidade premente no consumo do produto anunciado;
  • Transmitir a ideia de facilitismo na sua aquisição, minimizando os seus custos;
  • Transmitir a ideia de benefício no seu consumo exclusivo ou exagerado, comprometendo a valorização de uma dieta variada e equilibrada e um estilo de vida saudável;
  • Associar o consumo do produto à aquisição de estatuto, êxito social, especiais aptidões, popularidade, sucesso ou inteligência;
  • Utilizar em anúncios publicitários figuras, desenhos, personalidades e mascotes, entre outros, que se encontrem relacionados com programas destinados ao público infantil;
  •  Insinuar, na comunicação, que são benéficos para a saúde, omitindo os efeitos nocivos dos teores elevados que em si mesmo encerram.
Um despacho, de resto emitido pela Direcção-Geral de Saúde, em 21 de Agosto de 2019, traduziu “por miúdos”, quantificando, o significado de “elevado valor energético, teor de sal, açúcar, ácidos gordos saturados e ácidos gordos transformados”. Que, pelos vistos, continua a ser ignorado.
Não seria altura de as entidades com peculiares responsabilidades neste particular saírem do torpor a que se remeteram?

Mário Frota

apDC – DIREITO DO CONSUMO - Coimbra

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