quarta-feira, 3 de novembro de 2010

C U R I T I B A E C O L Ó G I C A ?

Acostumada a apreciar jardins, quer tenham vindo de passeios no Brasil ou no exterior,quer tenham aparecido nas lembranças perfumadas da casa paterna, passei a também exercer alguns ensaios de semear e ter a surpresas das flores.

Foi neste afã de melhorar a qualidade de vida de gente que vive a trocar de cadeira, quer no trabalho, quer no escritório de casa,que resolvi me dedicar a gostoso encontro com a natureza, quer ficando mais atenta aos passos do jardineiro, quer lendo e colocando em prática algumas aulas dos mais experientes,

Tanto gostei neste 50 anos de vida aproveitar o jardim, que de presente de aniversário pedi a meus filhos uma máquina de cortar grama.

Eles me olharam espantados, afinal, antes era uma bolsa Chanel, um perfume Ives Saint Lauren, uma viagem a lugares nunca d’antes navegados, tudo o que a sociedade de consumo permite.

No meio de processos, livros, homenagens, discursos, academias, estava eu em meu mundo a apreciar os encantos de uma vida mais fácil, da alegria nos pequenos gestos e objetos, quando resolvi também passar a minhas netas Luiza, 14 e Rafaela ,11, o que aprendi até o momento.

Desde algumas aulas de etiqueta à mesa, até maquiagem, nós três parecemos ter a mesma idade, ao menos uma vez por semana, quando as reúno especificamente para ensinar a arte de bem viver.

Foi numa destas tardes maravilhosas que investi em quatro belos vasos e também plantas maiores, fazendo com que as duas, plantassem e fossem responsáveis pelas flores, lembrando Saint Exupéry com a frase: “Você é responsável por aquilo que cativa”.Enquanto isso, Bruce Lee, o atento Buldogue Francês, ficava a observar nossos gestos, talvez conjecturando qual o vaso que ele iria atacar primeiro.

No final da aula, tínhamos quatro belos trabalhos, e nossas roupas estavam marron, bem como tudo o que nos cercava.

Foi quando Luiza disse que poderíamos batizar cada vaso, escolhendo ela o seu, Rafaela aceitou um bem lindo e as duas deram aos demais Anita para mim e Ariadne, a mãe delas e minha filha também ficou homenageada com as flores.

Depois banho, todas sorridentes a observar nossa contribuição à Cidade Ecológica.

Eis que chegou o carteiro.

Lembrei da música antiga e cantarolei para elas:

“O carteiro já chegou, o, o. Nem uma notícia de você, e, e. Todo o dia a mesma coisa, e eu de longe sem saber porquê”.

Era a Prefeitura a me dar 15 dias para acabar com meu jardim externo, arrancar cerca viva e flores que estão comigo há 20 anos.

Elas entenderam a minha decepção e, antes que viesse a multa, procurei ir pessoalmente ao Gabinete do Prefeito Municipal. Relatei o fato de estar enfeitando a cidade, com paisagista contratado por mim, mensalmente , para atender o jardim interno e externo com carinho, numa via rápida no Cabral.

As autoridades confirmaram que foi denúncia de algum vizinho, através do 156, inclusive com pedido para limpar as plantas.

Pêra aí?Me chamaram de porca, logo eu que toda manhã coloco as luvas e vou catar alguma garrafa ou papel jogado de gente que não ama Curitiba.

Logo eu que sou Vulto Emérito de Curitiba, que amo minha cidade e no campo profissional, quantas vezes me quiseram levar para bem longe, por muito valor, mas sempre achei que nenhum dinheiro do mundo poderia me separar de minha cidade amada, de minhas raízes, de meu jardim.

Cai por terra tudo o que acredito!

As ordens de aspones de plantão que nem devem ter ido ao local foram cumpridas.

Tudo cortado, inclusive, acabei com o jardim que circundava a árvore pública, vendo cair por terra a roseira, as palmas que estavam para abrir agora em novembro, bem como as flores vermelhas da aparada e elegante coroa de cristo.

Eu fiz a minha parte, mas a Prefeitura Municipal há uma semana não aparece para recolher o lixo, ou melhor, o fruto do assassinato das flores.

Bem na Primavera! Que fazer?

Mudar de cidade? Parar as aulas com Luiza e Rafaela?

Ir morar num apartamento?

Melhor escrever, como todo jornalista, escrever. Escrever e contar. Contar e protestar.

Talvez alguém ouça esta cidadã acuada, repreendida, maltratada, só porque quis fazer mais do que a sua parte de cidadã, quis plantar flores em Curitiba.

No meio do meu protesto, vem a frase que ecoa em meu coração:



Curitiba Ecológica? Onde?



Que saudades de Jaime Lerner!


Anita Zippin



(ANITA ZIPPIN, é advogada, jornalista, escritora, da Academia de Letras José de Alencar e Presidente da Associação Mundial de Periodistas e Escritoras)

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