Um poeta
Tenho
minhas dúvidas sobre qual a maior vocação de José Wanderlei Rezende. Um mais
desavisado diria que era a de ser juiz. Realmente, ele foi um brilhante
magistrado e fez uma carreira extraordinária, aposentando-se como
desembargador. Buscar a verdade e julgar com justiça foi o seu lema. Defender
os interesses de crianças e adolescentes foi o seu ideal.
Revelou-se
também um excelente professor.
Mas
para quem sabe ouvir o coração, logo constataria que a sua maior vocação era a
poesia. Sua alma sensível, calejada pelas experiências da vida, sabia
transformar o sentimento que habita as profundezas do ser humano em poemas.
Um
dia alguém desejou saber onde estava Deus. Ele logo percebeu que o inquiridor
estava perdido, descrente, caminhando rumo ao precipício.
Então,
respondeu-lhe, com um poema:
“Minha
alma atravessou as nuvens alvas/ ganhou levemente o espaço;/ percorreu os
astros e as galáxias;/ realizou a viagem dos sonhos, alcançando os confins do
etéreo,/ com tudo se maravilhando./ A certa altura, divisou,/ sentado num trono
dourado/, um querubim e dele indagou ansiosa:/ ‘Onde está Deus?/ Não sabias tu/
que todo o tempo/ estava dentro de ti?”.
Numa
outra vez, a sua amada, entristecida com uma decisão que julgava ter sido
equivocada, ele a confortou, com o um dos mais belos poemas que a alma humana
pode produzir:
“As
folhas caídas,/ não se preocupe com elas, meu amor./ Não chore ao vê-las
amarelas,/ sopradas ao vento pelas calçadas, ou pela relva./ Elas cumpriram sua
missa vital/ e não caíram sem um motivo nobre;/ foi tão somente pela vontade
d’Ele./ Se é seu destino que procura/, não se aflija quando tomar o atalho
aparentemente errado./ É lá na frente/ e somente lá,/ que compreenderá a
caridade que lhe foi feita./ É lá então, já folha caída,/que compreenderá o
significado de seus dias”.
Para
tristeza de seus familiares, amigos e fãs, no dia 20/03/2016 sua existência
terrena chegou ao fim e ele escreveu, silencioso, o seu último poema, um grito
mudo, que falava da alegria de ter vivido; de ter sido um juiz justo; um
marido, pai e avô maravilhoso, e, sobretudo, um poeta extraordinário.
Quando
estava para descer ao túmulo, já “Folhas Caídas”, eu me lembrei desse seu
poema. Alguém (uma colega, fugiu-me o nome agora) o buscou pelo celular,
através da internet e eu fiz a sua leitura. Enquanto eu o lia, uma pequena
folha veio voando pelo espaço, saída não se sabe de onde, e pousou sobre a
minha cabeça. Outro alguém a viu e me alertou. Comovido, eu a peguei e dei-a
para a sua filha, Cibele, guardar.
Certamente
foi a maneira que o poeta se valeu para dizer: “Eu estou aqui e continuarei
vivendo no coração de cada um de vocês”.
escritor
Desembargador Gilberto Ferreira
Nenhum comentário:
Postar um comentário